Remédios à base de canabidiol representam grande oportunidade para a indústria farmacêutica

Em 31 de janeiro de 2023, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, sancionou a Lei nº 17.618/2023 que permite o fornecimento gratuito de medicamentos à base de canabidiol (CDB) e tetrahidrocanabinol (THC) para pacientes com prescrição médica em todo o estado pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Apesar de polêmica, a Lei é bem-vista pela indústria farmacêutica, e, principalmente, por parentes de pacientes que já consumiam a substância, mas dependiam de um processo bastante burocrático para consegui-la.

A Lei, que deve entrar em vigor a partir de 1º de maio – 90 dias após a sanção – permitindo que os produtos sejam nacionais e importados, desde que estejam em conformidade com as exigências da Agência Nacional de Saúde (Anvisa). O objetivo é diagnosticar e tratar pacientes portadores de doenças que comprovem eficácia ou tenham produção científica que incentivem o tratamento para minimizar as consequências da patologia. Os medicamentos à base de cannabis costumam ser indicados para epilepsia, fibromialgia, ansiedade, depressão, distúrbios do sono, dor crônica, Alzheimer, esclerose múltipla e outras comorbidades, além de tratamentos para autismo, visando melhor qualidade de vida dos pacientes. A Lei também prevê a promoção de políticas públicas para informação sobre a cannabis medicinal.

Após a sanção da Lei, surgiram na mídia relatos de pessoas que comemoraram a decisão, visto que a Lei facilitará o tratamento de seus filhos. O próprio governador de São Paulo comentou na imprensa sobre seu sobrinho que sofre de Síndrome de Dravet – uma doença rara que causa convulsões. Como ainda não há regulamentação no Brasil para o plantio da erva, até pouco tempo atrás era necessário que essas famílias entrassem com pedidos na Justiça para usar o medicamento, que só passou ser importado em 2015, quando a Anvisa publicou a Resolução da Diretoria Colegiada – RDC nº 17/2015. Entretanto, a faixa de preço dos medicamentos a base de canadibiol está em torno de R$ 1.500,00. Segundo a Anvisa, 850 autorizações para importação do medicamento foram concedidas somente em 2015. De lá pra cá, o crescimento foi de 9311%, atingindo quase 80 mil pacientes autorizados em 2022.

Em 2017, a Anvisa aprovou o primeiro registro no país de medicamento à base de cannabis, o Mevatyl®. E, em dezembro de 2019, a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC nº 327/2019) regulamentou a importação e fabricação de produtos à base de canabidiol no Brasil. Porém, apenas os insumos farmacêuticos podem ser importados. Em 2022, a Anvisa publicou a RDC nº 660/2022 que permitiu a importação das medicações por pessoas físicas, além de conceder a primeira autorização para cultivo de cannabis no Brasil à Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). O processo poderia ocorrer em ambiente fechado para projetos de pesquisa a fim de conhecer os efeitos da erva e derivados em casos de distúrbios psiquiátricos e neurológicos. No mesmo ano, 23 produtos à base de cannabis já estavam aprovados pela Anvisa e apenas 5 associações possuíam autorização judicial para o plantio da erva no Brasil.

Entretanto, em 21 de março de 2023, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) suspendeu as tramitações individuais e coletivas para autorização da importação e do plantio de cannabis em todo o país, com base na Lei nº 11.343/2006, sobre a proibição de drogas em território nacional; Decreto nº 54.216/64, sobre entorpecentes; Decreto nº 79.388/77, sobre substâncias psicotrópicas; e Decreto nº 154/91 que proíbe o tráfico de entorpecentes e substâncias psicotrópicas. No dia 29, o Ministério da Justiça defendeu que o STJ autorize o cultivo da planta para uso medicinal, mas ainda não há uma definição do caso e os processos judiciais sobre o assunto permanecem suspensos.

Em outubro de 2022, o Conselho Federal de Medicina (CFM) tentou restringir o uso de medicamentos à base de canabidiol para somente o tratamento de crianças e adolescentes com Síndrome de Dravet e Lennox-Gastaut e Complexo de Esclerose Tuberosa. Após protestos de parlamentares e da sociedade civil, a entidade suspendeu a norma e deverá redigir uma nova regra.

Embora ainda não saibamos o que o futuro reserva para os medicamentos à base de cannabis no Brasil, há diversos Projetos de Lei que tramitam no Senado para que a sua distribuição seja liberada gratuitamente em âmbito nacional. Além disso, cerca de 50 países já permitem algum uso medicial da substância, sendo os Estados Unidos o maior mercado do mundo, com comercialização nas farmácias de 33 estados e a previsão de liberação em todo país até 2024.

Apesar de todas as controvérsias sobre o tema, os remédios à base de canabidiol devem representar uma grande oportunidade para a indústria farmacêutica, com a possibilidade de novos agentes na cadeia e o crescimento das empresas já existentes. Entretanto, caso sejam liberados novamente, é essencial se atentar às regras da Anvisa para importação e fabricação dos produtos, tais como a quantidade máxima de THC, que é 0,2%, exceto para casos de cuidados paliativos em pacientes em situação terminal; a proibição de publicidade, distribuição de amostras grátis e da comercialização em forma vegetal, cosmética ou alimentícia, dentre diversas outras normas. Por isso, as farmacêuticas que desejam apostar nesta prática devem sempre contar com amparo jurídico especializado para garantir o cumprimento da Lei e evitar punições. No mais, é esperar para ver qual será o desembaraço jurídico de toda essa polêmica.

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Artigo escrito por: Paula de Maragno, Sócia Fundadora da Maragno Advogados