Como se adaptar à nova legislação da EU de combate ao desmatamento

O Parlamento da União Europeia aprovou, em 19 de abril de 2023, a Lei que proíbe a importação de produtos oriundos de áreas desmatadas em florestas tropicais após dezembro de 2020. O texto ainda necessita da aprovação dos países membros da UE para entrar em vigor e deve ser revisado durante o período de dois anos, podendo incluir outros biomas e produtos. Cacau, borracha, café, soja, carvão vegetal, azeite de dendê, carne bovina, papel e madeira, além de produtos derivados, tais como: couro, móveis e chocolate já estão incluídos na proposta.

As empresas importadoras deverão provar que as suas cadeias de fornecimento não adotam práticas que infrinjam a Lei, por meio de ferramentas de vigilância via satélite e análise de DNA, além da geolocalização dos espaços onde as mercadorias foram produzidas. Os documentos deverão ser auditados por órgãos ambientais independentes.

Também será necessária a comprovação de que os direitos dos povos indígenas e comunidades locais foram respeitados durante a produção. Inclusive, que não houve uso de trabalho infantil e análogo à escravidão. Quem não cumprir a Lei poderá sofrer multas de até 4% sobre o faturamento.

Após o início da vigência da Lei, a Comissão Europeia classificará os países como de baixo ou alto risco em até 18 meses para definição dos níveis de controle dos produtos, que é o tempo previsto para as grandes empresas do agronegócio se adequarem à nova Lei. Pequenas e novas empresas terão o prazo de 24 meses para adaptação.

A Lei faz parte do Plano Climático da UE que também pretende reformular seu mercado de carbono, com a cobrança de imposto em suas fronteiras e a redução de 55% da emissão de gases de efeito estufa até 2030, atingindo a neutralidade climática até 2050. 

Na contramão das diretrizes europeias, a Câmara dos Deputados aprovou, em 24 de maio de 2023, o Projeto de Lei de Conversão, resultado da Medida Provisória nº 1.150/22, que, inicialmente, alterava o Código Florestal, Lei nº 12.651/12, prorrogando por 180 dias o prazo para que proprietários de imóveis rurais fizessem aderência ao Programa de Regularização Ambiental, Decreto nº 7.830/12, que dispõe sobre o cadastro ambiental rural e estabelece normas para preservar ou recuperar áreas preservadas.

Agora, as alterações efetuadas na MP também alteram a Lei da Mata Atlântica, Lei nº 11.428/06 e incluem a flexibilização do desmatamento da vegetação primária e secundária em regeneração avançada; elimina a necessidade de parecer técnico para desmatamento de áreas em estádio médio de regeneração em regiões urbanas; exclui a exigência de medidas compensatórias fora das áreas de preservação permanente e acaba com a necessidade de estudo prévio de impacto ambiental. As mudanças já haviam sido excluídas pelo Senado, mas os deputados decidiram retomar a proposta, que foi enviada para sanção ou alteração presidencial. A ação foi possível por se tratar de uma Medida Provisória, que inicia na Câmara e depois retorna para reavaliação da casa. O texto pode ser um grande entrave na negociação do acordo de livre comércio entre a UE e o Mercosul. Há relutância de países como a França, que exigem garantias sobre o cumprimento do Acordo de Paris – tratado mundial sobre as alterações climáticas. Entidades do agronegócio também apontam que a nova Lei da UE sobre o desmatamento também deverá ser um obstáculo na negociação.

Embora diversos países da UE se posicionem veementemente em favor do meio ambiente, de acordo com a ONG WWF, as importações feitas pela UE são responsáveis por 16% do desmatamento mundial. A região perde apenas para a China quando o assunto é o desmatamento de florestas tropicais.

A UE também é a maior importadora de soja no Brasil, respondendo por cerca de 60% do total dos seus derivados, além de 50% da importação do café brasileiro.

A Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG) defende que, com a nova Lei, a UE adota uma medida unilateral e tenta se sobrepor à legislação brasileira, que permite a exploração comercial de forma parcial em algumas regiões, com regras e autorizações específicas para cada uma delas, fazendo com que o produtor que explora áreas de maneira legal no Brasil esteja infringindo a Lei europeia. Na Amazônia, por exemplo, o Código Florestal determina que 80% da vegetação nativa seja mantida. Porém, de acordo com a plataforma Terra Brasilis, do Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), a Amazônia atingiu 941,34km² de desmatamento no primeiro semestre de 2022, o maior desde 2016.

A nova Lei europeia também tem recebido críticas de ambientalistas, incluindo membros do parlamento da UE, devido ao receio de que o desmatamento migre para outros biomas, como o cerrado, por exemplo. De acordo com o INPE, o cerrado registrou mais de 2 mil quilômetros quadrados de desmatamento nos primeiros quatro meses de 2023, um recorde para o período. Entretanto, as maiores empresas do setor agropecuário preveem que a partir de 2025 ou 2030, todo o desmatamento de suas cadeias produtivas seja eliminado neste ecossistema. Membros do parlamento europeu acreditam que este e outros biomas devam ser incluídos já nas próximas alterações da nova Lei.

Além da possível migração das áreas de desmatamento, a Lei elevará o custo da produção do agronegócio dos países exportadores – incluindo o Brasil – e este aumento possivelmente será repassado aos consumidores. Outra probabilidade – que tem sido cogitada como solução para especialistas do agronegócio – é que as exportações brasileiras se concentrem em outras regiões do globo, como a Ásia – ou ainda, voltar o foco para o mercado interno – principalmente no caso dos pequenos e médios produtores, que serão os mais afetados financeiramente para se adequarem à Lei europeia, uma vez que será necessário um alto investimento em tecnologia de ponta para cumprir os requisitos.

Neste sentido, o apoio do governo será mais do que essencial. O agronegócio brasileiro já necessita deste avanço em tecnologia, tanto para tornar a produção mais sustentável, quanto para potencializar seu crescimento, aproveitando novos mercados. Para o novo Plano Safra – programa do governo federal para investimento no agronegócio – foi anunciado  que mais de R$ 340 bilhões serão disponibilizados para apoio ao setor na safra 2022/2023, um aumento de 36% comparado ao plano anterior. A proposta também prevê mais crédito e com melhores condições de juros para quem adotar práticas mais sustentáveis.

A expectativa de sempre é que o agronegócio continue crescendo e fomentando a economia do país, e que as medidas necessárias para a preservação ambiental sejam implementadas de forma estratégica e eficiente, sem prejuízo para ambas as partes.

Ficou com alguma dúvida? Nós da Maragno Advogados teremos prazer em ajudar. Entre em contato.

Artigo escrito por: Paula de Maragno, Sócia Fundadora da Maragno Advogados.